A Influência do Negro na Cultura Brasileira
O entrecruzamento
de africanos, portugueses e índios, entre os séculos XVI e XVIII, consolidou
a estrutura genética da população brasileira. Toda a construção da economia
litorânea no Brasil, inclusive o desenvolvimento de sua vida urbana,
se deve ao mulato, mestiço de negro e ao branco.
Porém, a
contribuição do negro para a cultura brasileira vai além da povoação
e da prosperidade econômica através do seu trabalho. Vindos de diversas
partes da África, os escravos negros trouxeram suas matrizes culturais
e transformaram não apenas a sua religião, mas todas as suas raízes
em uma cultura de resistência social.
Aqui vamos abordar
rapidamente aspectos dessa influência, lembrando que ela é muito
ampla e profunda e nem sempre percebida, de tão arraigada que está no
nosso cotidiano.
Contribuição na linguagem
Os africanos, na ausência de uma unidade lingüística, já que provinham
de diferentes povos, foram praticamente obrigados a criar uma em comum
para que pudessem se entender.
A influência africana no português
do Brasil, que em alguns casos chegou também à Europa, veio do iorubá,
falado pelos negros vindos da Nigéria e notada principalmente no vocabulário
relacionado à culinária e à religião e também do quimbundo angolano,
em palavras como caçula, cafuné, moleque, maxixe
e samba, entre centenas de outros vocábulos.
Contribuição na religião
As religiões chamadas afro-brasileiras
surgiram durante o processo de colonização do Brasil, com a chegada
dos escravos africanos.
Mãe Stella de Oxóssi Iyálorixá do Candomblé, Salvador, Bahia, foto Agênca
Brasil, Antonio Milena Na realidade, os cultos afro-brasileiros
vêm da prática religiosa das tribos africanos. Por isso, cada uma tem
a sua forma peculiar de chamar o nome de Deus, promover seus cultos,
estruturar sua organização, celebrar seus rituais, contar sua história
e expressar as suas concepções através dos símbolos
Na tentativa
de catequizar os negros, os europeus promoveram uma grande mistura que
resultou nas hoje chamadas de religiões afro-brasileiras, como a Umbanda
e o Candomblé, fruto da inter-relação de culturas.
Alguns
povos bantos eram adeptos do candomblé e foram seus introdutores no
país. Atualmente, existem poucas casas de candomblé puro no Brasil,
concentradas principalmente na Bahia. Por outro lado, o candomblé de
caboclo e a cabula, outra variante do candomblé, tornaram-se as raízes
remotas do umbanda, o mais difundido culto afro-brasileiro, no Rio de
Janeiro.
Para resistir, o negro buscou, através de formas
simbólicas, alternativas que camuflassem seus deuses a fim de preservá-los
da imposição da igreja católica. Assim, o sincretismo foi uma forma
de defesa do negro e não a incorporação da religião negra à religião
predominante.
Festa do Senhor do Bonfim, em Salvador: Nessa festa popular,
misturam-se as heranças culturais dos escravos trazidos para o Brasil
e as tradições religiosas dos colonizadores portugueses.
Este
material é parte integrante da Enciclopédia Encarta 2001 e tem sua utilização
autorizada pela Microsoft Informática Ltda
Em diferentes momentos da história, aos poucos, as religiões afro-brasileiras
foram se formando nas mais diversas regiões e estados. É justamente
por isso que elas adotam diferentes formas e rituais, diferentes versões
de cultos.
A fé nos orixás se misturou à fé nos santos católicos
e o resultado disso tudo é o jeito brasileiro de praticar a religião.
"Em que outro país o mesmo devoto se sente à vontade para jogar flores
e perfumes no mar para Iemanjá, pedir namorado para Santo Antônio e
ainda acreditar na vida a após a morte do espiritismo?"
Revista
Criativa, da Editora Globo
SAIBA MAIS
Religiões
afro-brasileiras
Contribuição na música e na dança
O negro deu seu
ritmo à música brasileira. Também lhe deu nomes, como chorinho ou samba.
Por isso se diz que a música popular brasileira nasceu na África.
A raiz negra está em tudo: no samba, no pagode, no afoxé, nas festas
folclóricas como a do maracatu. Além dos ritmos, os africanos trouxeram
também instrumentos, como o berimbau, a cuíca e outros instrumentos
de percussão, como o atabaque o berimbau.
Afoxé
Fonte: Wikipedia
Berimbau
Fonte: Wikipedia
Agogô
Fonte: Wikipedia
O samba era chamado pelos angolanos de semba. Esse gênero musical
foi se transformando, ganhou novos instrumentos, chegou ao Rio de Janeiro
e atualmente é característico de todas as regiões brasileiras.
Mistura de dança, luta e música, a capoeira também surgiu com os negros,
que a utilizavam como arma de defesa. Durante a escravidão, reuniam-se
em roda depois do trabalho para cantar, dançar, jogar capoeira ou reverenciar
com música os seus orixás. Batiam palmas, batucavam, reviviam suas tradições.
E assim a música negra se afirmava em meio a tanto sofrimento.
Capoeira
Os escravos misturavam instrumentos musicais, dança
e luta, enganando seus Senhores de Engenho, que pensavam estarem eles
apenas "dançando".
A capoeira sofreu repressão por grande
parte das autoridades policiais e também os senhores de engenho perseguiam
os escravos praticantes de capoeira, porque a atividade dava ao capoeirista
um sentido de nacionalidade, individualidade e auto-confiança, formando
grupos coesos e jogadores ágeis e perigosos e também porque, às vezes,
no jogo, os escravos se machucavam, o que era economicamente indesejável.
O capoeirista era considerado um marginal, um delinqüente. O Decreto-lei
487 acabou temporariamente com a capoeira, mas os negros resistiram
até a sua legalização.
Mas, as coisas mudaram em fins da
década de 30 do século passado. Um capoerista chamado Manuel dos Reis
Machado, Mestre
Bimba foi convidado por Juracy
Montenegro Magalhães, a ir ao Palácio do Governo baiano. E agora?
Mestre Bimba ficou assustado, achou que seria preso!
Para
sua surpresa, o governador queria que se apresentasse com seus alunos
para mostrar "a nossa herança cultural" para amigos e autoridades no
Palácio do Governo.
Em 09 de julho de 1937, Mestre Bimba
conseguiu o registro de sua Academia, a primeira reconhecida no país.
Nesse ano, inicia-se a ascensão sócio-cultural da capoeira, que volta
ao cenário cultural, estando presente na música, nas artes plásticas,
na literatura, nos palcos...
Em 15 de julho de 2008 a capoeira
foi reconhecida como Patrimônio Cultural Brasileiro e registrada como
Bem Cultural de Natureza Imaterial.
E no período da escravidão?
Será que havia artistas afro-brasileiros? Sim, e alguns até ficaram
famosos, mas a maioria só foi descoberta muito depois de sua morte!
Um pouco depois do período escravocrata, conhecemos alguns músicos negros,
pioneiros da chamada música popular brasileira, como José Antônio da
Silva Callado e Pixinguinha.
Muito depois, na década de 30, os artistas afro-brasileiros ganharam
o seu espaço, sobretudo com o boom do rádio! E aí... milhões de pessoas
ouviam os artistas negros.
Maracatu Foi um tempo em que intelectuais e artistas
começaram a reivindicar uma nova percepção de Brasil, como o país da
miscigenação e da democracia racial.
Foi Carmem
Miranda, uma mulher branca, a eleita "Rainha do Samba". Não
por acaso. Sabe-se que a artista divulgava a música de artistas negros,
quando eles não conseguiam trabalho.
Sabe-se ainda, por sua
insistência e influência muitos artistas negros saíram do anonimato
para subir aos palcos, incluindo nesse grupo grandes nomes como Dorival
Caymmi e Sinval Silva, motorista de Carmem e autor do clássico
"Adeus Batucada".
Mesmo assim, até o final da década de 50,
foram poucos os artistas negros que conseguiram ter contratos assinados
com gravadoras.
Nos anos 60, muitas composições sobre personagens
negros eram racistas e ninguém reclamava. Apesar da ingenuidade de canções
como "O teu cabelo não nega mulata (…) Mas como a cor não pega, mulata/
Mulata eu quero teu amor", está na cara o sinal de preconceito. "Mas
como a cor não pega" fala da negritude como se fala de uma doença.
Gilberto
Gil e Caetano
Veloso, através de suas composições, colaboraram para que a
força política do negro fosse mais reconhecida!
Depois deles,
vários artistas negros despontaram no hip-hop, rap ou samba com a deliberada
intenção de despertar o orgulho negro entre os jovens.
SAIBA
MAIS
Maracatu
Contribuição na culinária
É impossível falar da influência dos africanos sem lembrar a herança
que eles deixaram para a nossa alimentação. Acarajé, mungunzá, quibebe,
farofa, vatapá são pratos originalmente usados como comidas de santo,
ou seja, comidas que eram oferecidas às divindades religiosas
cultuadas pelos negros. Hoje, porém, são dignos representantes da culinária
brasileira.
As negras africanas começaram a trabalhar nas cozinhas dos Senhores
de Engenho e introduziram novas técnicas de preparo e tempero dos alimentos.
Também adaptaram seus hábitos culinários aos ingredientes do Brasil.
Assim, foram incorporados aos hábitos alimentares dos brasileiros o
angu, o cuscuz, a pamonha e a feijoada, nascida nas senzalas e feita
a partir das sobras de carnes das refeições que alimentavam os senhores;
o uso do azeite de dendê, leite de coco, temperos e pimentas; e de panelas
de barro e de colheres de pau. Você sabia que os traficantes de escravos
também trouxeram para o Brasil ingredientes africanos? É o caso da banana,
ícone de brasilidade mundo afora e da palmeira de onde se extrai o azeite
de dendê.
Feijoada
Enfim... todos o pratos vindos do continente africano foram
reelaborados, recriados, no Brasil, com os elementos locais. E haja
criatividade e capacidade de improvisação! O dendê trazidos pelos portugueses
para queimar em lamparinas e iluminar as noites escuras do novo continente
logo foi parar na panela das mucamas. "Desde a África elas já sabiam
que o azeite podia ser usado nas comidas".
VIDEOTECA:
Mojubá:
a cor da cultura